Quem sou eu, afinal?
Não é meu nome ou o que faço da vida. Não é o lugar onde moro ou as coisas que gosto. É simplesmente quem sou.
Minha essência, portanto. Meu inexplicável eu. Criptograma que por anos venho tentando decifrar.
Poderia ser algo simples, inerte no tempo. Mas quanto mais tempo se passa, mais complexo vai ficando. Cada vez mais cifras, mais códigos.
Essas coisas de sentimentos que os humanos criaram, sabe? Pensei ser de Marte, ou algum híbrido e descobri que sou um balde de tudo isso que chamam de sentimentos - coisas que só complicam a descoberta do meu eu.
Nem mesmo sei se vou morrer porque nunca me provaram isso. Sei que se morrer, tudo isso se vai para meu túmulo e nada mais poderá ser descoberto por mim.
Então... por que vivo tentando descobrir quem sou se nunca descobrirei? Estarei satisfeito sendo um pouco de todos aqueles que me cativam. Eles merecem o meu tempo mais do que merecem-no minhas dúvidas.
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
segunda-feira, 14 de junho de 2010
Defeito para os demais e qualidade só para mim
Como eu sou idiota...
É. Faço coisas sem pensar... vou além do desejo pessoal. Minhas atitudes são infantis e talvez felizes demais para o mundo de hoje.
Se eu falo, tanto faz, porque credibilidade, a mim, não pertence mais. E talvez isso tudo seja irreversível.
Mas vamos tomar as leis como exemplo e me dar o direito de resposta, sim?
Sou idiota, assumo. Mas é porque antes de viver para outros, eu vivo para mim mesmo.
É. Faço coisas sem pensar... vou além do desejo pessoal. Minhas atitudes são infantis e talvez felizes demais para o mundo de hoje.
Se eu falo, tanto faz, porque credibilidade, a mim, não pertence mais. E talvez isso tudo seja irreversível.
Mas vamos tomar as leis como exemplo e me dar o direito de resposta, sim?
Sou idiota, assumo. Mas é porque antes de viver para outros, eu vivo para mim mesmo.
domingo, 30 de maio de 2010
Enfadonho e trivial
Cansa ouvir, só ouvir. E por isso falo. Falo muito, talvez mais do que deveria.
Dedicação também cansa. Porque quase nunca é recíproca.
Ser cansa, mas não ser cansa ainda mais. Quer dizer... o que você é e qual é a sua utilidade? Hoje, é questão de utilidade. Você pode ser útil para a realização de uma pessoa, para o entretenimento de outra, ou pode ser inútil. Ser inútil, cansa. E saber que é apenas útil cansa ainda mais.
Receber críticas cansa muito, mas compensa se você souber que isso é para o seu bem. Saber que é criticado para satisfação de outrem é que realmente cansa.
Aconselhar cansa, cansa muito, mas é bom... aconselhar as paredes consegue cansar ainda mais.
Cansa falar — mal — dos outros. Mas de você já falaram tanto... então sinta-se exausto, vale a pena, agora. Não vale a pena se não for merecido, então faça merecer, canse.
—E por que queres minha companhia? — perguntei.
—Porque você ME faz bem. — você me respondeu.
—E no que me faz bem tu pensas? — Foi uma resposta merecida, e que eu nunca achei que daria. Mas se não desse, acho que estaria ainda mais cansado.
É por isso que me sinto fatigado, enfadonho...
Sei que são só palavras para você. E adivinha só? Saber disso cansa.
Dedicação também cansa. Porque quase nunca é recíproca.
Ser cansa, mas não ser cansa ainda mais. Quer dizer... o que você é e qual é a sua utilidade? Hoje, é questão de utilidade. Você pode ser útil para a realização de uma pessoa, para o entretenimento de outra, ou pode ser inútil. Ser inútil, cansa. E saber que é apenas útil cansa ainda mais.
Receber críticas cansa muito, mas compensa se você souber que isso é para o seu bem. Saber que é criticado para satisfação de outrem é que realmente cansa.
Aconselhar cansa, cansa muito, mas é bom... aconselhar as paredes consegue cansar ainda mais.
Cansa falar — mal — dos outros. Mas de você já falaram tanto... então sinta-se exausto, vale a pena, agora. Não vale a pena se não for merecido, então faça merecer, canse.
—E por que queres minha companhia? — perguntei.
—Porque você ME faz bem. — você me respondeu.
—E no que me faz bem tu pensas? — Foi uma resposta merecida, e que eu nunca achei que daria. Mas se não desse, acho que estaria ainda mais cansado.
É por isso que me sinto fatigado, enfadonho...
Sei que são só palavras para você. E adivinha só? Saber disso cansa.
quinta-feira, 29 de abril de 2010
Metamorfo
Não digo e não direi mais.
Nego-me a reafirmar que sou algo, ainda mais algo imutável.
Durante toda a vida, crendo que tivesse tal personalidade, e "tadah"... quem sou eu, afinal? Não sou nada. E tu também... tu não és nada.
Nós somos sensíveis à mutação, só isso.
Achamos que nunca seremos; mas seremos, somos. A certeza não moldou a nossa personalidade, e por isso sou grato a ela. Talvez suponhas que não sou homem o suficiente para cumprir com o que digo; e é fato, não consigo enganar a mim mesmo.
Cabe a nós apenas tentar não ceder tão fácil à essa mutação. Porque não sou como a Hidra de Lerna, tenho apenas uma face apta a mudanças.
A minha variação não altera apenas a minha vida.
Nego-me a reafirmar que sou algo, ainda mais algo imutável.
Durante toda a vida, crendo que tivesse tal personalidade, e "tadah"... quem sou eu, afinal? Não sou nada. E tu também... tu não és nada.
Nós somos sensíveis à mutação, só isso.
Achamos que nunca seremos; mas seremos, somos. A certeza não moldou a nossa personalidade, e por isso sou grato a ela. Talvez suponhas que não sou homem o suficiente para cumprir com o que digo; e é fato, não consigo enganar a mim mesmo.
Cabe a nós apenas tentar não ceder tão fácil à essa mutação. Porque não sou como a Hidra de Lerna, tenho apenas uma face apta a mudanças.
A minha variação não altera apenas a minha vida.
segunda-feira, 26 de abril de 2010
A aprendiz de frustrações
Ela podia afirmar tudo, menos que não aprendeu.
Sofreu e com isso aprendeu. Aprendeu coisas que já serviram; coisas que servem; coisas que servirão. Aprendeu sobre a matemática, sobre a química, sobre a gramática, sobre a física. Ela aprendeu a respeitar.
Percebeu que a vida não anda conforme seus planos; e que a beleza exterior engana.
Sentiu. Ela sentiu na pele o que é perder alguém para a morte. E sentiu o que as pessoas não costumam sentir: isso ela não soube definir com palavras.
Era iminente: estava prestes a sofrer de novo. Mas aprenderia ainda mais, por isso não teve qualquer medo.
E em um desses dias rotineiros, pensou em algo que havia descoberto: desbobriu que não se faz promessas ao infinito. Poderia errar durante toda a vida, mas as promessas nunca lhe voltariam à boca.
Sofreu e com isso aprendeu. Aprendeu coisas que já serviram; coisas que servem; coisas que servirão. Aprendeu sobre a matemática, sobre a química, sobre a gramática, sobre a física. Ela aprendeu a respeitar.
Percebeu que a vida não anda conforme seus planos; e que a beleza exterior engana.
Sentiu. Ela sentiu na pele o que é perder alguém para a morte. E sentiu o que as pessoas não costumam sentir: isso ela não soube definir com palavras.
Era iminente: estava prestes a sofrer de novo. Mas aprenderia ainda mais, por isso não teve qualquer medo.
E em um desses dias rotineiros, pensou em algo que havia descoberto: desbobriu que não se faz promessas ao infinito. Poderia errar durante toda a vida, mas as promessas nunca lhe voltariam à boca.
domingo, 18 de abril de 2010
Não se encarregou de cuidar do futuro
É porque nunca gostara muito de beijos. Sempre preferiu estar ali, compartilhando o momento, sentindo a mão suave, com aquela cabeça sobre seu colo. Falava da vida e das coisas que fazem dela a vida.
Mas se quer saber mesmo, nunca conseguiu acreditar completamente nas pessoas. Porque são corrompíveis em sua maioria. Porque por pessoas já foi enganado. Porque recebeu desprezo em troca de belos sentimentos, que agora supõe-nos que sente.
Apesar disso, nunca conseguiu traduzir a palavra amor, sempre nela acreditando francamente. Sempre esperou, porque o tempo se demonstra tão sábio, com toda a sua idade, embora muito compassivo por não ter acabado com essa podre humanidade - aquela humanindade a qual ele já perdeu quase toda a fé.
E se aquilo é pecado, que peque, que morra. Nunca achou muito lógico que as pessoas tivessem tanta vontade de acabar com a felicidade alheia. E é por isso que estava ali, sentindo aquela delicada mão na sua. O futuro? Ah, isso ele deixou como responsabilidade do Sr. Tempo, tão sábio.
Mas se quer saber mesmo, nunca conseguiu acreditar completamente nas pessoas. Porque são corrompíveis em sua maioria. Porque por pessoas já foi enganado. Porque recebeu desprezo em troca de belos sentimentos, que agora supõe-nos que sente.
Apesar disso, nunca conseguiu traduzir a palavra amor, sempre nela acreditando francamente. Sempre esperou, porque o tempo se demonstra tão sábio, com toda a sua idade, embora muito compassivo por não ter acabado com essa podre humanidade - aquela humanindade a qual ele já perdeu quase toda a fé.
E se aquilo é pecado, que peque, que morra. Nunca achou muito lógico que as pessoas tivessem tanta vontade de acabar com a felicidade alheia. E é por isso que estava ali, sentindo aquela delicada mão na sua. O futuro? Ah, isso ele deixou como responsabilidade do Sr. Tempo, tão sábio.
quinta-feira, 1 de abril de 2010
Olá, figurante
Aquelas pessoas enchem a boca para dizer que te amam, põem-te pra cima, animam-te com bobas palavras... mas sempre querem algo em troca, num câmbio sentimental.
Então tu passas por dificuldades e aí eles mostram seus seguros sentimentos, ou a falta deles. Afinal, agora tu não podes conceber-lhes os desejos. Por ora tu és figurante.
Num futuro, incluirão todos aqueles que fizeram-lhe rir ou chorar em seu belíssimo discurso e teu nome estará ali somente para que não tenhas argumentos contra elas.
Então tu passas por dificuldades e aí eles mostram seus seguros sentimentos, ou a falta deles. Afinal, agora tu não podes conceber-lhes os desejos. Por ora tu és figurante.
Num futuro, incluirão todos aqueles que fizeram-lhe rir ou chorar em seu belíssimo discurso e teu nome estará ali somente para que não tenhas argumentos contra elas.
sexta-feira, 19 de março de 2010
O assalto, a memória e os salgados da cantina.
Um dia desses, este que vos fala estava indo ao colégio. Manhã, pouco movimento... e como o colégio fica a cinco quarteirões, seria até incoerente ir de ônibus. Fui andando mesmo.
Quando faltava pouco menos de um quarteirão, a 10 metros vi um homem estranho. Ele me olhava de longe e ia em minha direção. Tentei dar um paso para o lado para ver se ele ia para o lado oposto, para que não nos esbarrassemos. Mas ele coincidentemente - ou nem tanto - ia para o mesmo lado que eu.
Sabe aquelas cenas de filme que o tempo passa bem devagar e você consegue pensar em tudo muito rápido? Acredite. Isso realmente acontece. Pensei em todas as possibilidades e conclui que ele iria me assaltar — depois de seis vezes assaltado, digamos que eu tenha um tanto de experiência. Infelizmente eu acertei.
—Passa o celular.
Corri. Sabia que ele não tinha arma e nem condição física para me enfrentar.
E ele? Nenhum esforço. Atravessou a avenida gritando ofensas para mim.
Algumas semanas, desde então, se passaram. E hoje, pouco mais cedo, quando sai do colégio, à tarde, conversando com Alice observei alguém familiar indo em nossa direção sorrateiramente, na parada de ônibus.
Tentei lembrar quem seria a figura e me dei conta de que era o meu amiguinho do começo da história que "pediu" meu celular — e que não recebeu.
Ele olhava para mim como se lembrasse das minhas feições, mas não poderia nos assaltar ali... seria idiota da parte dele. Tinha muita gente.
Olhei para Alice e perdi totalmente o foco da conversa. Tentei telepatia, mas ela não conseguiu ouvir os meus pensamentos.
—Alice, vamo pra lá — disse sussurando e apontei para um local mais afastado — O cara que me assaltou tá atrás de você.
Ela ficou pálida e me acompanhou.
Na hora foi meio tenso, mas quando entramos no ônibus — é, fui de ônibus depois disso — rimos horrores. Afinal, quando formos formados e famosos, teremos que nos lembrar dessa situação. E eu vou ter o maior prazer de detalhar tudo a Jô — lembrando, claro, que estava com Alice.
Nota1: Os salgados da cantina do colégio têm maconha, só pode. Sempre gargalho horrores depois de comer. Foi o que comemos antes desse memorável acontecimento.
Nota2: Provavelmente só ela, Alice, irá entender esse final, mas ok.
Nota3: Você deve estar imaginando o que tem a ver o título com o post. Hm... eu me assusto com minha memória às vezes. Não é a primeira vez que lembro de rostos aleatórios. O bom é que essas lembranças resultam em boas risadas.
Quando faltava pouco menos de um quarteirão, a 10 metros vi um homem estranho. Ele me olhava de longe e ia em minha direção. Tentei dar um paso para o lado para ver se ele ia para o lado oposto, para que não nos esbarrassemos. Mas ele coincidentemente - ou nem tanto - ia para o mesmo lado que eu.
Sabe aquelas cenas de filme que o tempo passa bem devagar e você consegue pensar em tudo muito rápido? Acredite. Isso realmente acontece. Pensei em todas as possibilidades e conclui que ele iria me assaltar — depois de seis vezes assaltado, digamos que eu tenha um tanto de experiência. Infelizmente eu acertei.
—Passa o celular.
Corri. Sabia que ele não tinha arma e nem condição física para me enfrentar.
E ele? Nenhum esforço. Atravessou a avenida gritando ofensas para mim.
Algumas semanas, desde então, se passaram. E hoje, pouco mais cedo, quando sai do colégio, à tarde, conversando com Alice observei alguém familiar indo em nossa direção sorrateiramente, na parada de ônibus.
Tentei lembrar quem seria a figura e me dei conta de que era o meu amiguinho do começo da história que "pediu" meu celular — e que não recebeu.
Ele olhava para mim como se lembrasse das minhas feições, mas não poderia nos assaltar ali... seria idiota da parte dele. Tinha muita gente.
Olhei para Alice e perdi totalmente o foco da conversa. Tentei telepatia, mas ela não conseguiu ouvir os meus pensamentos.
—Alice, vamo pra lá — disse sussurando e apontei para um local mais afastado — O cara que me assaltou tá atrás de você.
Ela ficou pálida e me acompanhou.
Na hora foi meio tenso, mas quando entramos no ônibus — é, fui de ônibus depois disso — rimos horrores. Afinal, quando formos formados e famosos, teremos que nos lembrar dessa situação. E eu vou ter o maior prazer de detalhar tudo a Jô — lembrando, claro, que estava com Alice.
Nota1: Os salgados da cantina do colégio têm maconha, só pode. Sempre gargalho horrores depois de comer. Foi o que comemos antes desse memorável acontecimento.
Nota2: Provavelmente só ela, Alice, irá entender esse final, mas ok.
Nota3: Você deve estar imaginando o que tem a ver o título com o post. Hm... eu me assusto com minha memória às vezes. Não é a primeira vez que lembro de rostos aleatórios. O bom é que essas lembranças resultam em boas risadas.
domingo, 14 de março de 2010
Susto
Sono bom. Me senti seduzido pela cama. Mas me dei conta de que algo estava errado e peguei o celular na cabeceira. 6h49min.
Levantei num salto e corri pera pegar a roupa pensando em todas as broncas que levaria da mãe e na aula que iria perder — com a esperança brasileira de que ainda conseguiria assisti-la.
Parei e voltei para a cama: hoje é Domingo.
Um alívio subiu pelas entranhas, mas o susto tirou completamente o resto do sono que eu tinha.
Levantei num salto e corri pera pegar a roupa pensando em todas as broncas que levaria da mãe e na aula que iria perder — com a esperança brasileira de que ainda conseguiria assisti-la.
Parei e voltei para a cama: hoje é Domingo.
Um alívio subiu pelas entranhas, mas o susto tirou completamente o resto do sono que eu tinha.
sábado, 6 de março de 2010
Preconceito, clichê e anti-clichê.
O preconceito é, sem dúvidas, um dos assuntos mais clichês da atualidade. Nunca se ouviu tanto falar sobre preconceito. Mas, afinal, o que seria preconceito? Preconceito seria, segundo o dicionário, um conceito formado antecipadamente e sem fundamento sério ou imparcial. Pré + conceito.
Ainda mais clichê é a discussão sobre os preconceitos discriminatórios. Racial, social, sexual... Na verdade, esses seriam os preconceitos menos comuns na sociedade. Presencia-se o preconceito a toda hora, em todos os lugares, independente de classe social.
Mas, fugindo do clichê, quem não tem preconceito? Seria incoerente assumir isso. Seria até falacioso, dizer que nós, humanos, não agimos por instintos, muitas vezes, e negamos coisas apenas pela suposição de que essas coisas não nos interessam.
Deixar de ouvir uma música apenas por ser estrangeira. Negar uma comida que não atrai visualmente. Dizer que não gosta de tais tipos de filmes ou livros... O preconceito nos salva... nos mantém distantes de coisas que podem parecer perigosas. Ao mesmo tempo, nos distancia do desconhecido, das pessoas, da cultura, do mundo. A humanidade foge do mundo, do diferente, indiretamente caminha para o isolamento. Só se ouve falar sobre rotina, mas quem quer ser diferente? Quem quer fazer algo diferente?
O mundo - dos humanos - é diversidade. O Homo sapiens tem a capacidade de pensar, de se diferenciar, de agir através da razão. E o preconceito é a ação instintiva, regressiva.
Mas é inevitável. Pensamentos esteriotipados fazem parte da personalidade humana dúbia. Quem não associa povos a seus costumes como se não houvese exceções; como se as sociedades fossem completamente homogêneas? Supomos, às vezes, ser isso um pensamento crítico. Mas a criticidade só é possível depois do conhecimento.
E quando o metafísico entra no meio? E quando não se demonstra nenhum tipo de autenticidade? Quando o pensamento em massa supera a capacidade da formação de uma opinião própria e a religião se mostra apenas como controladora de massas, fazendo os homens agirem por instinto?
Assumir os preconceitos e tentar mudar é uma atitude racional, inteligente, humana. Mas acabar com todos? Impossível... pelo menos, tente acabar com os idiotas.
Ainda mais clichê é a discussão sobre os preconceitos discriminatórios. Racial, social, sexual... Na verdade, esses seriam os preconceitos menos comuns na sociedade. Presencia-se o preconceito a toda hora, em todos os lugares, independente de classe social.
Mas, fugindo do clichê, quem não tem preconceito? Seria incoerente assumir isso. Seria até falacioso, dizer que nós, humanos, não agimos por instintos, muitas vezes, e negamos coisas apenas pela suposição de que essas coisas não nos interessam.
Deixar de ouvir uma música apenas por ser estrangeira. Negar uma comida que não atrai visualmente. Dizer que não gosta de tais tipos de filmes ou livros... O preconceito nos salva... nos mantém distantes de coisas que podem parecer perigosas. Ao mesmo tempo, nos distancia do desconhecido, das pessoas, da cultura, do mundo. A humanidade foge do mundo, do diferente, indiretamente caminha para o isolamento. Só se ouve falar sobre rotina, mas quem quer ser diferente? Quem quer fazer algo diferente?
O mundo - dos humanos - é diversidade. O Homo sapiens tem a capacidade de pensar, de se diferenciar, de agir através da razão. E o preconceito é a ação instintiva, regressiva.
Mas é inevitável. Pensamentos esteriotipados fazem parte da personalidade humana dúbia. Quem não associa povos a seus costumes como se não houvese exceções; como se as sociedades fossem completamente homogêneas? Supomos, às vezes, ser isso um pensamento crítico. Mas a criticidade só é possível depois do conhecimento.
E quando o metafísico entra no meio? E quando não se demonstra nenhum tipo de autenticidade? Quando o pensamento em massa supera a capacidade da formação de uma opinião própria e a religião se mostra apenas como controladora de massas, fazendo os homens agirem por instinto?
Assumir os preconceitos e tentar mudar é uma atitude racional, inteligente, humana. Mas acabar com todos? Impossível... pelo menos, tente acabar com os idiotas.
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
Correpondência sob estrelas
Corriam pelos campos de trigo. Não importava o quanto estivessem cansados, encontravam-se sempre ali, naquela mesma hora. Também não importava o tempo, contanto que soubessem que a Terra continuava a girar em torno do seu próprio eixo. Ali foram favorecidos pelo bom tempo. Por lá, viu-se chuva há muito tempo. E a primavera já começava a borrar o céu de um tom alaranjado, naquele crepúsculo, o que encantava seus dois maiores espectadores.
Depois sentavam-se na grama fofa. Olhavam pro céu e contavam as estrelas, sem medo de verrugas nascerem-lhes entre os dedos.
—Aquela ali é Alpha Centauri — ele disse.
—Hm... bem bonita.
—Ela pode nem estar mais ali.
—Como assim?
—O que vemos agora é uma imagem de quatro anos e meio. — disse — Só podemos saber se ela ainda esteve mesmo ali daqui a quatro anos e meio.
Ele adorava ver a expressão de curiosa.
—Ela é da constelação de Centauro.
Agora ligavam as estrelas para ver que imagens formavam, como duas crianças ingênuas. E só quando faltava pouco para as oito, levantavam-se e iam para suas casas.
No dia seguinte, idem. Mas ele fez questão de levá-la para sentar um pouco mais cedo.
—Marcela... — chamou-a para si.
Ela sabia que quando ele a chamava pelo nome, não era coisa lá muito agradável. Logo sentiu as contrações na barriga e o pulso acelerando. Por alguns segundos lembrou-se da infância, quando sua mãe a chamava pelo nome completo, por mais que a pequena garota não gostasse. Mas ali, não importava muito se gostava ou não. Se a chamava assim, certeamente estava furiosa por causa de alguma "molecagem de garota", como dizia.
Sentia o sange correr pelos capilares mais rapidamente. A respiração ofegante... Olhou-o nos olhos e tentou ali achar conforto. Ainda podia ver a simpatia naqueles olhos verdes, antes que anoitecesse e tudo se tonasse negro. E agora reparava nos delicados traços daquele rosto que tanto admirava.
—Sim? — respondeu tentando disfarçar aquele sentimento de mau presságio.
Agora era ele que tinha o que temer. Não suportava apenas imaginar um dia perdê-la em meio a tão grande mundo. Mas sempre confiou-lhe. Sentia-se impotente quando estavam juntos. Sentia-se fraco, bobo... E, encantado pelo olhar meigo de garota ingênua, confiava-lhe tudo.
Chegou várias vezes a questionar se ela realmente o merecia. Tinha vivivo várias coisas as quais não lhe traziam muito orgulho. E já havia contado à jovem amada, mesmo que chegasse a perdê-la por isso. Se contara-lhe, é porque certamente havia ali uma confiança recíproca.
—Eu não sei como lhe dizer isso — ele desabafou.
—Apenas diga — ela insintiu.
Antes que começasse, respirou fundo. Então iniciou:
— Não sei se poderemos viver juntos agora. — tentou conter-se e continuou — Não que eu não queira. Lógico que quero! Você não é nada mais que a minha vida fora de mim. Mas, por ora, preciso passar uns tempos fora. Me chamaram para trabalhar na metrópole.
Ela ouvia antentamente sem interrompê-lo.
— E quando juntar o suficiente, poderei trazer você comigo para vivermos lá. — finalizou. Era um pequeno resumo de tudo, na verdade.
Ela não sabia o que dizer. Mas se sentia feliz. Ele estava a pouco de ser reconhecido como profissional que era. Imaginava que fosse algo pior.
— Promete que vai se comunicar comigo sempre que puder?
Foram cada um para sua casa, um pouco depois. Como sempre faziam.
E lá, Marcela chorou. Não sabia o porquê. Não se achava com motivos para chorar. Achava-se fraca e agora ela que perguntava a si se ele a marecia verdadeiramente.
Foi-se uma semana solitária. Mas sempre, às cinco horas, depois que saia do Hospital onde trabalhava, ia para casa e vestia um de seus leves vestidos de algodão com estampas variadas para olhar o pôr do sol à Oeste.
Duas semanas, três... aquele mesmo ritual diário que nunca virava rotina. Mesmo nos dias mais cansativos, desmarcava qualquer compromisso naquele horário e ia observar as estrelas. Diziam as amigas que Marcela estava louca e que só um dia não faria diferença. Mas ela fingia não ouvir. Não era questão de loucura.
Quatro semanas. Era um dia de verão como qualquer outro. O vento frio do final de um dia quente entrava pela janela do seu quarto, fazendo as flores contidas num vaso simples sobre o móvel agitarem. Passava a mão pelo vestido florido. Arrumava as alças e a faixa sob o busto, preparada para um encontro.
Encontrava-se sempre com ele. Mesmo que não fisicamente. Os leves traços do jovem estavam presentes em seu pensamento. E aquele era um outro dia como aqueles.
Preparava-se para sair. Calçou as sandálias, rodou a mão sobre a maçaneta, prestes a ir. Então ouviu que alguém a chamava. Era a mãe, que conservara uma expressão serena e acolhedora indo a seu encontro.
—Chegou correpondência, minha linda.
Marcela, num salto, abraçou a mãe e pegou o envelope. Não abriu. Agradeceu e continuou em direção ao encontro.
Confiou sempre nele e ali via que não estava errada. Via as letras garranchadas do amado, no envelope. Mas manteve fechado, enquanto acompanhava O movimento aparente do Sol.
Antes que a grande estrela se fosse por completo, transformando o laranja num violeta azulado muito escuro, tomou coragem e abriu a correspondência lentamente. Podia reconhecer a letra dele. Imediatamente veio-lhe um sorriso que duraria, certamente, até o dia em que ele viria com o objetivo de levá-la à metrópole.
"Eu ainda olho as estrelas. Todo dia.
Thales"
Dobrou o papel e rumou para casa à espera do dia.
Depois sentavam-se na grama fofa. Olhavam pro céu e contavam as estrelas, sem medo de verrugas nascerem-lhes entre os dedos.
—Aquela ali é Alpha Centauri — ele disse.
—Hm... bem bonita.
—Ela pode nem estar mais ali.
—Como assim?
—O que vemos agora é uma imagem de quatro anos e meio. — disse — Só podemos saber se ela ainda esteve mesmo ali daqui a quatro anos e meio.
Ele adorava ver a expressão de curiosa.
—Ela é da constelação de Centauro.
Agora ligavam as estrelas para ver que imagens formavam, como duas crianças ingênuas. E só quando faltava pouco para as oito, levantavam-se e iam para suas casas.
No dia seguinte, idem. Mas ele fez questão de levá-la para sentar um pouco mais cedo.
—Marcela... — chamou-a para si.
Ela sabia que quando ele a chamava pelo nome, não era coisa lá muito agradável. Logo sentiu as contrações na barriga e o pulso acelerando. Por alguns segundos lembrou-se da infância, quando sua mãe a chamava pelo nome completo, por mais que a pequena garota não gostasse. Mas ali, não importava muito se gostava ou não. Se a chamava assim, certeamente estava furiosa por causa de alguma "molecagem de garota", como dizia.
Sentia o sange correr pelos capilares mais rapidamente. A respiração ofegante... Olhou-o nos olhos e tentou ali achar conforto. Ainda podia ver a simpatia naqueles olhos verdes, antes que anoitecesse e tudo se tonasse negro. E agora reparava nos delicados traços daquele rosto que tanto admirava.
—Sim? — respondeu tentando disfarçar aquele sentimento de mau presságio.
Agora era ele que tinha o que temer. Não suportava apenas imaginar um dia perdê-la em meio a tão grande mundo. Mas sempre confiou-lhe. Sentia-se impotente quando estavam juntos. Sentia-se fraco, bobo... E, encantado pelo olhar meigo de garota ingênua, confiava-lhe tudo.
Chegou várias vezes a questionar se ela realmente o merecia. Tinha vivivo várias coisas as quais não lhe traziam muito orgulho. E já havia contado à jovem amada, mesmo que chegasse a perdê-la por isso. Se contara-lhe, é porque certamente havia ali uma confiança recíproca.
—Eu não sei como lhe dizer isso — ele desabafou.
—Apenas diga — ela insintiu.
Antes que começasse, respirou fundo. Então iniciou:
— Não sei se poderemos viver juntos agora. — tentou conter-se e continuou — Não que eu não queira. Lógico que quero! Você não é nada mais que a minha vida fora de mim. Mas, por ora, preciso passar uns tempos fora. Me chamaram para trabalhar na metrópole.
Ela ouvia antentamente sem interrompê-lo.
— E quando juntar o suficiente, poderei trazer você comigo para vivermos lá. — finalizou. Era um pequeno resumo de tudo, na verdade.
Ela não sabia o que dizer. Mas se sentia feliz. Ele estava a pouco de ser reconhecido como profissional que era. Imaginava que fosse algo pior.
— Promete que vai se comunicar comigo sempre que puder?
Foram cada um para sua casa, um pouco depois. Como sempre faziam.
E lá, Marcela chorou. Não sabia o porquê. Não se achava com motivos para chorar. Achava-se fraca e agora ela que perguntava a si se ele a marecia verdadeiramente.
Foi-se uma semana solitária. Mas sempre, às cinco horas, depois que saia do Hospital onde trabalhava, ia para casa e vestia um de seus leves vestidos de algodão com estampas variadas para olhar o pôr do sol à Oeste.
Duas semanas, três... aquele mesmo ritual diário que nunca virava rotina. Mesmo nos dias mais cansativos, desmarcava qualquer compromisso naquele horário e ia observar as estrelas. Diziam as amigas que Marcela estava louca e que só um dia não faria diferença. Mas ela fingia não ouvir. Não era questão de loucura.
Quatro semanas. Era um dia de verão como qualquer outro. O vento frio do final de um dia quente entrava pela janela do seu quarto, fazendo as flores contidas num vaso simples sobre o móvel agitarem. Passava a mão pelo vestido florido. Arrumava as alças e a faixa sob o busto, preparada para um encontro.
Encontrava-se sempre com ele. Mesmo que não fisicamente. Os leves traços do jovem estavam presentes em seu pensamento. E aquele era um outro dia como aqueles.
Preparava-se para sair. Calçou as sandálias, rodou a mão sobre a maçaneta, prestes a ir. Então ouviu que alguém a chamava. Era a mãe, que conservara uma expressão serena e acolhedora indo a seu encontro.
—Chegou correpondência, minha linda.
Marcela, num salto, abraçou a mãe e pegou o envelope. Não abriu. Agradeceu e continuou em direção ao encontro.
Confiou sempre nele e ali via que não estava errada. Via as letras garranchadas do amado, no envelope. Mas manteve fechado, enquanto acompanhava O movimento aparente do Sol.
Antes que a grande estrela se fosse por completo, transformando o laranja num violeta azulado muito escuro, tomou coragem e abriu a correspondência lentamente. Podia reconhecer a letra dele. Imediatamente veio-lhe um sorriso que duraria, certamente, até o dia em que ele viria com o objetivo de levá-la à metrópole.
"Eu ainda olho as estrelas. Todo dia.
Thales"
Dobrou o papel e rumou para casa à espera do dia.
quarta-feira, 6 de janeiro de 2010
Pensei que fosse lógico, mas para esclarecer...
... não são desabafos meus, ok? São contos.
Pronto, agora, siga lendo.
Pronto, agora, siga lendo.
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
Só um "xixizinho"
Chegamos e pensei que grande parte dos meus problemas tivesse sido resolvida. Pelo menos ali, à noite.
Primeiro, procuramos um lugar. Isolado, afinal, eramos um casal e acho que é isso que os casais fazem de início quando entram num cinema: procurar um lugar "reservado" para fazer algo que não convém - embora quisesse mesmo ver o filme.
Apontei para a última fileira, no canto direito. Ele assentiu e nós fomos.
Era confortável e não tinha muita gente por perto. Esperamos enquanto o filme não começava. Ele soltava suspiros impacientes... o dia deve ter sido cansativo.
— Preciso usar o toilet, amor — avisei-lhe — Volto rápido!
— Por que não foi antes?
Quando era criança, odiava ainda mais quando me perguntavam isso. "Por que não foi antes?" Não era óbvio? Senti vontade agora. Mas não queria discutir e acabar com um encontro que planejávamos à semanas.
Levantei e fui. Meio que de soslaio... não gosto de chamar atenção.
Algo que me deixa furiosa em mim: eu sempre levo a bolsa. Mesmo que alguém possa segurá-la, sempre levo. E não é desconfiança nem nada. Eu me esqueço mesmo. Mas já estava na metade do caminho e voltar seria incoerente.
Minha bexiga apertava e eu suava frio só de imaginar o alívio. Respirei. Falei pra mim mesma: só mais alguns passos. E finalmente cheguei.
Abri a porta com um sorriso bobo. Mas logo o sorriso se desfez. Parecia que todas as mulheres do cinema resolveram fazer xixi naquele banheiro minúsculo.
Na pia de mármore, adolescentes conversavam e se maquiavam com naturalidade. Bons tempos aqueles. Três mulheres improvisaram uma fila. Eu gostava disso, em nós, mulheres: organização.
— Calma — pensava — só alguns minutinhos.
Cruzei minhas pernas em X e acompanhei a fila. Conversavam rindo e eu me perguntava se realmente queriam usar o banheiro.
Uma eternidade e a da "cabine" - sempre chamei de cabine - direita saiu, ajeitando a minissaia. E a primeira da fila ainda hesitou. Finalmente entrou.
As adolescentes combinavam com quem cada uma ficaria... mas eu não conseguia entender perfeitamente. Minha bexiga não deixava.
Logo a segunda e em pouco tempo a terceira. Seria a próxima... e isso acabaria. Levou cinco segundos contados, desde a entrada da terceira e a primeira saiu.
Entrei desengonçada... nada de perder a elegância correndo.
Não sei o que é que dá... quando chegamos, parece que a vontade é duplicada. Mas eu tinha que controlar aquilo... ainda precisava me arrumar - sim, mulheres se arrumam para urinar.
Nesse instante eu pensava nas doenças que poderia contrair só de sentar naquele vasso. As aulas de biologia da sétima série vieram como filme, apesar de já ter se passado mais de dez anos desde então. Arrudiei o vaso em papel higiênico com uma velocidade incrível, mesmo que não tivesse a intenção de sentar ali.
Fechei a porta, mas a tranca era falha... então segurei com uma das mãos a porta com a bolsa entre os dedos. A outra mão, a direita, serviu para preparar toda a roupa e me apoiar em uma das paredes.
— Uff!
Alivio único, aquele. Abri os olhos e percebi que lacrimejei de tanto alívio.
Na porta, algumas besteiras escritas, mas uma me chamou antenção:
"lora gata. atendo homens e mulheres" e logo após o telefone, meio que numa letra garranchada. Não era pelo conteúdo um tanto peculiar, mas pelo fato de colocar que atende homens num banheiro feminino. Como se eles fossem ver.
Quando acabei, tive a sensação de que já tinha ganhado o dia ali, naquele momento. Mas a ficha cai, era só um "xixizinho". Então puxei o papel higinênico, na esperança de que saísse algo. Saiu, mas só um quadradinho. Me arrependi de usar tanto papel para arrudiar o vaso se nem mesmo sentaria nele.
Tentei limpar, enquanto o braço que segurava a porta ficava dormente...
Escutei as adolescentes indo e pouco tempo depois, as três que "estavam no meu caminho" desde a árdua espera.
Não aguentei e soltei um suspiro. Esperava que ali não tivesse ninguém. Se tivesse, já era tarde.
Levantei assim que pude e me arrumei. No espelho deparo-me com o que não gostaria de ver: eu estava acabada. Limpei as lágrimas que tinham escorrido e dei um retoque na make up. Lavei as mãos voltando a lembrar das doenças que o professor de biologia descrevia sem paciência para as crianças que queriam saber de tudo, menos daquilo.
Encarei a porta por alguns segundos... não gostaria de tocar na maçaneta suja. Por sorte, a porta estava entreaberta. Tentei abri-la com a ponta do scarpin, mas acho que levaria muito menos tempo se simplesmente abrisse com a mão. Alguém de fora empurrou a porta. Uma garota que provavelmente estava tão desesperada quanto eu, quando cheguei, mas tinha a sorte de não enfrentar fila. Agradeci e andei um pouco mais rápido para a sala.
O filme já tinha começado e eu estava prestes a passar pelo pior da noite. Quando cheguei ao lado dele, ele me olhou com uma cara abusada.
— Demorou muito.
Sim, isso era o pior da noite. Evitei briga, mas na minha cabeça, chamava-o de mil coisas ao mesmo tempo. Só evitei mesmo porque sabia que ele não tinha ideia do que é ser mulher.
Primeiro, procuramos um lugar. Isolado, afinal, eramos um casal e acho que é isso que os casais fazem de início quando entram num cinema: procurar um lugar "reservado" para fazer algo que não convém - embora quisesse mesmo ver o filme.
Apontei para a última fileira, no canto direito. Ele assentiu e nós fomos.
Era confortável e não tinha muita gente por perto. Esperamos enquanto o filme não começava. Ele soltava suspiros impacientes... o dia deve ter sido cansativo.
— Preciso usar o toilet, amor — avisei-lhe — Volto rápido!
— Por que não foi antes?
Quando era criança, odiava ainda mais quando me perguntavam isso. "Por que não foi antes?" Não era óbvio? Senti vontade agora. Mas não queria discutir e acabar com um encontro que planejávamos à semanas.
Levantei e fui. Meio que de soslaio... não gosto de chamar atenção.
Algo que me deixa furiosa em mim: eu sempre levo a bolsa. Mesmo que alguém possa segurá-la, sempre levo. E não é desconfiança nem nada. Eu me esqueço mesmo. Mas já estava na metade do caminho e voltar seria incoerente.
Minha bexiga apertava e eu suava frio só de imaginar o alívio. Respirei. Falei pra mim mesma: só mais alguns passos. E finalmente cheguei.
Abri a porta com um sorriso bobo. Mas logo o sorriso se desfez. Parecia que todas as mulheres do cinema resolveram fazer xixi naquele banheiro minúsculo.
Na pia de mármore, adolescentes conversavam e se maquiavam com naturalidade. Bons tempos aqueles. Três mulheres improvisaram uma fila. Eu gostava disso, em nós, mulheres: organização.
— Calma — pensava — só alguns minutinhos.
Cruzei minhas pernas em X e acompanhei a fila. Conversavam rindo e eu me perguntava se realmente queriam usar o banheiro.
Uma eternidade e a da "cabine" - sempre chamei de cabine - direita saiu, ajeitando a minissaia. E a primeira da fila ainda hesitou. Finalmente entrou.
As adolescentes combinavam com quem cada uma ficaria... mas eu não conseguia entender perfeitamente. Minha bexiga não deixava.
Logo a segunda e em pouco tempo a terceira. Seria a próxima... e isso acabaria. Levou cinco segundos contados, desde a entrada da terceira e a primeira saiu.
Entrei desengonçada... nada de perder a elegância correndo.
Não sei o que é que dá... quando chegamos, parece que a vontade é duplicada. Mas eu tinha que controlar aquilo... ainda precisava me arrumar - sim, mulheres se arrumam para urinar.
Nesse instante eu pensava nas doenças que poderia contrair só de sentar naquele vasso. As aulas de biologia da sétima série vieram como filme, apesar de já ter se passado mais de dez anos desde então. Arrudiei o vaso em papel higiênico com uma velocidade incrível, mesmo que não tivesse a intenção de sentar ali.
Fechei a porta, mas a tranca era falha... então segurei com uma das mãos a porta com a bolsa entre os dedos. A outra mão, a direita, serviu para preparar toda a roupa e me apoiar em uma das paredes.
— Uff!
Alivio único, aquele. Abri os olhos e percebi que lacrimejei de tanto alívio.
Na porta, algumas besteiras escritas, mas uma me chamou antenção:
"lora gata. atendo homens e mulheres" e logo após o telefone, meio que numa letra garranchada. Não era pelo conteúdo um tanto peculiar, mas pelo fato de colocar que atende homens num banheiro feminino. Como se eles fossem ver.
Quando acabei, tive a sensação de que já tinha ganhado o dia ali, naquele momento. Mas a ficha cai, era só um "xixizinho". Então puxei o papel higinênico, na esperança de que saísse algo. Saiu, mas só um quadradinho. Me arrependi de usar tanto papel para arrudiar o vaso se nem mesmo sentaria nele.
Tentei limpar, enquanto o braço que segurava a porta ficava dormente...
Escutei as adolescentes indo e pouco tempo depois, as três que "estavam no meu caminho" desde a árdua espera.
Não aguentei e soltei um suspiro. Esperava que ali não tivesse ninguém. Se tivesse, já era tarde.
Levantei assim que pude e me arrumei. No espelho deparo-me com o que não gostaria de ver: eu estava acabada. Limpei as lágrimas que tinham escorrido e dei um retoque na make up. Lavei as mãos voltando a lembrar das doenças que o professor de biologia descrevia sem paciência para as crianças que queriam saber de tudo, menos daquilo.
Encarei a porta por alguns segundos... não gostaria de tocar na maçaneta suja. Por sorte, a porta estava entreaberta. Tentei abri-la com a ponta do scarpin, mas acho que levaria muito menos tempo se simplesmente abrisse com a mão. Alguém de fora empurrou a porta. Uma garota que provavelmente estava tão desesperada quanto eu, quando cheguei, mas tinha a sorte de não enfrentar fila. Agradeci e andei um pouco mais rápido para a sala.
O filme já tinha começado e eu estava prestes a passar pelo pior da noite. Quando cheguei ao lado dele, ele me olhou com uma cara abusada.
— Demorou muito.
Sim, isso era o pior da noite. Evitei briga, mas na minha cabeça, chamava-o de mil coisas ao mesmo tempo. Só evitei mesmo porque sabia que ele não tinha ideia do que é ser mulher.
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